Mês de nascimento e morte de Frida Kahlo: o mito multifacetado
Magdalena Carmen Frida Kahlo Calderón, a pintora mexicana mais conhecida em todo o mundo, nasceu sob o signo de câncer no dia 6 de julho de 1907 no pueblo de Coyoacán e faleceu em 13 de julho de 1954. No entanto, Frida nunca se cansou de repetir que nasceu com a revolução mexicana, em 1910. Como recorda Raquel Tibol, em seu livro Frida Kahlo em sua luz mais íntima: “Frida ornamentava a verdade, a inventava, a extraía, mas jamais a tergiversou”.
A artista desse modo realiza o desejo da militante comunista na menina de um México novo, urbano e rural, marxista e revolucionário, fomentado por um fundamentalismo utópico da esquerda que assistiu às marchas de operários e camponeses. E cujo líder orgânico, Vicente Lombardo Toledano, criador das centrais operárias, trajava fraque e tomava champagne.
Fruto geracional dessa bipolaridade social, a artista vai plasmar no universo pictórico o martírio de um México sacrificado e penitente dos anos quarenta. Nessas figurações desenha-se em cores fortes um rosto de mil faces: Frida apaixonada por Trotski, Frida transgressora do eterno feminino, Frida intensamente biográfica, fiel ao amor, ao eterno amante Diego Rivera, a si mesma. Mas não menos dolorosa, Frida fraturada em seu corpo físico, transpassada em seu espírito, Frida princípio masculino-feminino, filha do sol, diva dos surrealistas, Frida mercadoria…
Frida Kahlo morou nos Estados Unidos na década de 30 (São Francisco, Detroit, Nova York), e nesse período vendeu muitas obras aos americanos. No entanto, sua admiração pelo povo mexicano e repugnância ao imperialismo norte-americano e europeu é tema que atravessa toda a produção. Em “As Duas Fridas” (1939), vê-se uma Frida vestida com uma roupa típica mexicana segurando a mão da outra Frida, com uma roupa vitoriana, ambas estão com seus corações expostos, porém inteiros, ligados apenas pela artéria aorta, da roupa da Frida “européia” goteja sangue. Através dessa cena se pode ler a vivacidade do México, enquanto a Europa, a perder sangue, está morrendo. Anterior a esse quadro, “Auto – Retrato na fronteira do México com os Estado Unidos” (1932) e “O meu vestido está ali pendurado ou Nova York” (1933). Neles, os elementos que marcam a presença mexicana se contrapõem ao industrialismo norte-americano, como parte do processo de dominação imperialista. Um México pós-revolucionário, emergente, ali se firma na preservação de suas matrizes, na construção de uma identidade cultural.
Assim como los tres grandes (Rivera, Orozco, Siqueiros) muralistas mexicanos, Frida Kahlo, mestiça, herdeira dos povos pré-colombianos, adapta de maneira inovadora a riqueza imagética das civilizações dos olmcas, aztecas e toltecas – os deuses e os mitos, as figuras e os códigos, as pirâmides e os templos. Essa invocação constituiu um gesto político no tempo em que o crescente interesse pela arte indígena coincidia com um sentimento nacionalista cada vez mais presente. Os afrescos de Diego Rivera no Palacio de Cortez (1930) em Cuernavaca, ainda que em perspectiva pedagógica, são o signo de um verdadeiro salto na história da cultura latino-americana, por sua desmistificação iconoclasta do Conquistador e pela simpatia do artista para com os guerreiros indígenas.
Já ela, vestida de rainha asteca, de rosto altivo, narra um povo ainda por vir.
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